Sem registros há quatro décadas, pesquisadores redescobriram uma rara planta, encontrada apenas no Planalto da Ibiapaba, no Norte dos estados do Ceará e Piauí. Espécie da família Amaryllidaceae, a mesma das açucenas, da cebola e do alho, a cearanthes fuscoviolacea, também conhecida como cebola-brava, deve ser classificada como Em Perigo (EN) de extinção, de acordo com os critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN).
O estudo foi apresentado no II Encontro Virtual de Sistemática, Biogeografia e Evolução (Encontro SBE 2021), encerrado no último dia 23, pelo professor e pesquisador Antonio Campos-Rocha, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que lidera a pesquisa.
“FLOR DO CEARÁ”
A espécie, tratada como “esquecida e de identidade duvidosa”, pelos pesquisadores, foi encontrada em agosto de 2015 no Planalto da Ibiapaba, durante a 11ª Expedição do Movimento Pró-Árvore, fundado em 2011. A planta, que leva o seu nome o cearanthes como “flor do Ceará”, foi localizada em um pequeno fragmento de Caatinga, em Viçosa do Ceará e, nos anos seguintes, mais duas pequenas populações foram registradas no Piauí.
O agrônomo e botânico Antônio Sérgio Farias-Castro, fundador do Movimento Pró-Árvore, que participou da pesquisa, explica que por fazer parte do grupo das Amaryllidaceae, portanto tem um bulbo (cebola), isso garante a sobrevivência da planta, que fica parte do ano sem folhas ou flores. “Diferente de outras espécies que ocorrem no Ceará ela floresce na estação seca. Tem flores delicadas e belas”, descreve.
O achado, segundo o pesquisador, representa um avanço para os estudos em andamento com a família Amaryllidaceae.A importância se dá pela raridade, dúvidas que havia sobre a própria identidade já que havia pouca informação. Cada espécie tem informações genéticas únicas. E falta ainda mais informações sobre dispersão, por exemplo”ANTÔNIO SÉRGIO FARIAS-CASTROAgrônomo e botânico
O botânico acredita que a espécie “provavelmente ocorria em ambientes semelhantes” do Ceará. “A alteração dos ecossistemas é intensa e histórica. Mais de 80% da Serra da Ibiapaba sofreu algum grau de intervenção”, completa.
DIFICULDADES
A ocorrência da espécie, hoje, se dá justamente dentro da APA da Serra da Ibiapaba, ou seja, dentro de uma Unidade de Conservação (UC). Como uma das categorias menos restritivas, a área total possui 1,59 milhão de hectares, o que dificulta o trabalho de fiscalização e preservação. “Infelizmente, os órgãos ambientais responsáveis não dispõem em seus quadros de botânicos e ecólogos”, lamenta Farias-Castro.
Na avaliação dele, a área onde estão inseridas as plantas poderia ser criada uma Reserva Ecológica. “Uma Área de Proteção Ambiental pouco contribui com a preservação já que teoricamente qualquer um pode chegar e retirar as plantas para vender ou o local ser desmatado para roça ou pasto. Não há controle. Se o terreno é particular, o dono se acha no direito de explorar, o que tem lógica”, justifica o botânico
O chefe da APA Serra da Ibiapaba, Ricardo Madeira Tannús, admite que a espécie não tem um programa específico de preservação dentro da unidade. “As atividades de fiscalização são no espectro mais amplo, na preservação do bioma como um todo”, explica o representante do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Lá, além dos biomas caatinga e cerrado, ainda há resquícios de mata atlântica. “O nosso foco de preservação também são os recursos hídricos”, completa.
Como, pela categoria de uso sustentável, a APA ainda permite que pessoas morem dentro de sua área e também o funcionamento de empreendimentos. Lá, por exemplo, há atividades de energia, carcinicultura, mineração, pecuária, entre outros, que podem acontecer sem restrição legal. Porém, toda ação deve passar por adequação que respeite a vegetação e os recursos hídricos. A APA Serra da Ibiapaba abrange 26 municípios, tendo cerca de 80% do seu território no Piauí e outros 20% no Ceará. Como a área é muito extensa, o ICMBio planeja rediscutir o seu plano de manejo, “que está muito defasado”, observa Ricardo.
O documento criado para direcionar a gestão da UC é de 1998, antes mesmo da lei que regulamenta o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), de 2000.
“Vamos fazer uma renovada neste documento para garantir a gestão dentro dele e fazer um estudo aprofundado das características, incluindo a questão biológica, as espécies de relevante interesse social, ecológico e científico. Pensando nisso, faremos o planejamento”, projeta Ricardo, que prometeu conversar com os pesquisadores que atuaram no estudo da cearanthes fuscoviolacea e inclui-los na discussão.
Por Redação do Sobral Pop News com Emily Aragão / Fonte: Diário do Nordeste