Com morte por coronavírus em bairros da periferia, Fortaleza é principal preocupação do Governo

Desde que o novo coronavírus foi identificado pela primeira vez, o tal inimigo invisível ultrapassou oceanos. Ele veio de avião, de carro, em simples apertos de mão e passou por barreiras igualmente invisíveis, aportando no Ceará. Mas não só aqui, no Brasil – e no mundo – há uma crise sanitária, que desemboca problemas econômicos e evidencia os problemas humanos e sociais pelos quais grande parte da população vive. É nesse momento que a vulnerabilidade é mais latente, e a sobrevivência, palavra de ordem. 

Tanto que, atualmente, é a periferia de Fortaleza a principal preocupação do secretário da Saúde do Ceará, o cardiologista Carlos Roberto Martins Rodrigues Sobrinho, o Dr. Cabeto. Em entrevista exclusiva ao Sistema Verdes Mares, o médico explana pontos de vista, relata a estrutura disposta pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e avalia o impacto do isolamento social. De acordo com ele, a quarentena afastou o colapso do sistema de saúde em 20 dias no Ceará. O titular da Pasta também avalia quais os próximos passos a serem tomados pela gestão.

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De acordo com o Integra SUS, Fortaleza já tem casos em quase todos os bairros. A Secretaria Municipal da Saúde acredita que a Regional 1 será o próximo ponto crítico, depois da Regional 2. Há um indicativo de crescimento dos números de casos e óbitos e uma certa migração do vírus? 
A gente está analisando isso dia a dia, vendo esse movimento há uma semana. Os números de casos e óbitos isolados nesses bairros pressupõe um número de contaminados maior do que a gente imagina. A gente vai fazer uma força-tarefa. Agora, em bairros altamente adensados, com estrutura social ruim, com assentamentos precários, esse risco aumenta muito porque a gente sabe que fazer isolamento nessas condições é extremamente difícil. Precisamos fortalecer o trabalho e temos discutido com agentes de saúde da atenção básica que é preciso chegar mais precoce nessas pessoas, isolá-las o mais rapidamente, e de hospitais de campanha, UPAs e hospitais de referência preparados. A gente sabia que, quando (a doença) chegasse na periferia, íamos ter uma realidade social muito dura e queremos estar preparados para isso.76 mortesforam registradas no Ceará por coronavírus De acordo com a plataforma da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), o IntegraSUS, 76 pessoas morreram no Ceará. Dessas, 59 aconteceram em Fortaleza. Outros 14 municípios tiveram óbitos

No balanço das internações publicados pelo site da Secretaria da Saúde (Sesa), há uma redução no número de pacientes em leitos de hospitais privados e aumento nos públicos. É outro indicativo da migração para regiões mais pobres?
Há um aumento dos bairros mais periféricos e um aumento progressivo das internações nos hospitais públicos e dos movimentos das UPAs da Capital e do interior. A gente tem percebido na nossa Central de Regulação, uma procura maior (nessas unidades), principalmente dos casos graves. A gente quer que a atenção básica avalie o indivíduo em situações de risco para que, em torno do 3º e 7º dias dos sintomas, ele seja acompanhado pelos agentes de saúde, pela atenção básica, para que a gente possa se adiantar e diminuir o número de doentes que precisam de um leito de UTI.

Há registro de pessoas da periferia de Fortaleza ou do interior do Estado, com a Covid-19, que estejam morrendo em suas casas?
Temos mortes na periferia de Fortaleza. Não é bem morte em casa, nós temos um caso de morte residencial, mas a maioria é chegando muito tarde na UPA com insuficiência respiratória. Alguns chegando em Crateús, Quixeramobim com insuficiência respiratória. As pessoas estão com medo de ir para a consulta, de fazer exame médico, de se contaminar. É preciso lembrar que quando precisar, os hospitais estão aí para atender. Acho que a Covid-19 expõe algumas feridas. O Estado do Ceará estava se antecipando a isso, vem lutando para desburocratizar o sistema, para facilitar o acesso, regionalizar e cortar esses cordões políticos tradicionais. Nós vamos fazer o que for possível para reverter isso.

Mesmo com os leitos extras providenciados pelo Governo, o Ceará está se encaminhando para um colapso no sistema de saúde estadual? Se sim, quando ele deve acontecer?
Vai depender um pouco da curva do Ceará. A gente espera que essa força nova que as pessoas estão dando no isolamento social retarde um pouco essa curva pra estruturar o sistema. Hoje, o Estado tem estrutura para demanda até o fim de abril. Nós temos previsão de ampliação com leitos de respirador – além dos 200 que esperamos receber perto de abril -, tem previsão de mais 500 já contratados. Infelizmente, eu acho que a Covid pegou o mundo de calça curta, e olhe que o Ceará vem fazendo isso desde janeiro. Nós conseguimos centralizar algumas unidades que eu acho que vão dar resposta. Fazer o (Hospital) Leonardo da Vinci, estruturar num lugar só é uma questão estratégica. Mas nós temos deficiência de pessoal de UTI e uma série de deficiências para pulverizar isso em todos os municípios. 

Então, tem a possibilidade de o Governo do Estado solicitar a estrutura de saúde de outros hospitais particulares?
Eu tenho discutido isso com hospitais privados. Começamos a negociação com o Hospital Batista, ele reformou a estrutura e, se antes tinha problemas de ordem sanitária, agora está plenamente adequado para funcionamento. Fizemos um protótipo que vão ser 130 leitos de enfermaria mais 10 de UTI e estamos concluindo essa negociação até quarta-feira (15). Não adianta nada você colocar UTI sem garantir um atendimento adequado. Eu pessoalmente, vou a algumas regiões nessa semana. Devo visitar Maracanaú, Cascavel, Iguatu, Caucaia, a região de Crateús, Sobral, Juazeiro para que a gente veja in loco o que esta acontecendo.1.747 casosCom 10.026 casos suspeitos, o Ceará confirmou 1.747 casos. 6.462 exames foram realizados e 56 municípios notificaram Covid-19 até às 17h10 do domingo (12), conforme a Sesa

Com relação aos profissionais de saúde, até semana passada, 151 tinham sido afastados por problemas respiratórios. O número aumentou?
Não tem sido fácil, a gente tem visto aumentar o número de profissionais diretamente relacionados à Sesa (Secretaria da Saúde). Notificações de atestado, tinha mais de 1.500 na área de saúde. Esse é um fenômeno da Covid que também aconteceu em vários países. E aí vem a questão dos insumos dos EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) e a forma de utilização deles. Temos um estoque que vai até o fim de abril e que a gente precisa repor. Estamos reforçando parte do que estamos importando da China, além das doações da Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará) e da remodelagem das indústrias locais para a produção de máscaras. Porque quando se fala no profissional de saúde, você tem que garantir que ele vai estar protegido e não vai se infectar. 

Diante dessas baixas em médicos e enfermeiros, por exemplo, como a Sesa tem atuado?
Geralmente, nós temos um médico para cada dez pacientes. Como temos mais enfermeiros disponíveis, a ideia é colocar um enfermeiro a cada dois leitos e um médico a cada 20 para que não haja prejuízo do tratamento em situações extremas. Na Itália, tem ortopedista dando plantão em UTI. É preciso que as pessoas lembrem que esse momento é o da solidariedade, é de sair da caixinha, é o momento de pensar além do que estamos vivendo. E estamos vivendo uma crise internacional, uma guerra internacional que está expondo algumas feridas e algumas realidades nos países mais pobres. 

Qual foi o impacto prático e objetivo do decreto de quarentena do governador Camilo Santana para o achatamento da curva de contágio do coronavírus?
Se as nossas previsões (de pico de notificações e óbitos) estavam para o início de abril, a gente retardou isso para o fim do mês, isso é muito importante do ponto de vista de estruturação (do sistema de saúde), numa crise de insumo e de material. A gente avalia que a quarentena adiou o pico em pelo menos 20 dias.

Com o estudo da projeção de casos, é possível que Secretaria recomende ao Governo do Estado uma nova ampliação do decreto de quarentena?
Vamos analisar momento a momento de uma maneira muito responsável. Se tiver que prorrogar, vai ter que prorrogar. Se tiver que fazer em algumas regiões específicas, vamos fazer. Isso precisa ser feito cientificamente, assim tem dado certo. Está dentro do ideal? Tá não. A gente nunca acha que está no ideal, mas sempre precisa melhorar cada vez mais.

Depois desse período de quarentena, vem a volta à normalidade. Já é possível ter uma previsão de quando isso vai acontecer?
Na experiência de outros países, eles começaram a reduzir as quarentenas quando começaram a cair o número de mortos e o número de contaminados/dia – e a gente vai fazer isso de forma regional, de local a local. Porque não acontece uniformemente, e é preciso ter muito cuidado para não ter repique. Alguns países afrouxaram e viram voltar o risco de contaminação. 

A Flourish map

Por Redação do Sobral Pop News com informações do Diário do Nordeste

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