Maqueiro do IJF relata luta contra a Covid-19: “me sentia afogado fora d’água, foi um milagre”

O vírus veio rápido, furtivo e sem aviso. No primeiro dia, veio a “moleza” no corpo. Dois dias depois, “muita tosse e muita falta de ar”. Chegando ao hospital, a taxa de oxigênio no sangue estava em 60% – quando o normal varia entre 95% e 99%. A internação foi imediata. Urgente. Assim começou a luta de Francisco Ribeiro da Silva, 41, contra a Covid-19, “provavelmente” contraída no Instituto Dr. José Frota, onde atua como maqueiro há 16 anos.

Por ser profissional que atua na área da saúde, ao surgirem os primeiros sintomas, Ribeiro procurou a emergência do Hospital São José de Doenças Infecciosas (HSJ), em Fortaleza, onde recebeu atestado médico de 14 dias para afastamento do trabalho. Nas 48h seguintes, porém, a doença piorou consideravelmente.

“Voltei lá e disse ao médico ‘doutor, não aguento ficar em casa’. Minha saturação tava em 60%, o ideal é 97% pra lá. Fui internado imediatamente”, relembra. A equipe, então, receitou a ele uma “manobra” respiratória, para recuperar a oxigenação e evitar uma intubação. “O exercício era ficar de barriga pra baixo, puxando e soltando o ar. No dia seguinte, a saturação chegou a 97%. O médico disse que foi um milagre”, narra o maqueiro.

O tratamento seguiu de acordo com o protocolo estabelecido pela Secretaria Estadual da Saúde (Sesa), ainda em abril, à base de cloroquina associada ao antibiótico azitromicina. Ao quinto dia de internação, Ribeiro foi transferido para um leito de Covid-19 no IJF – foi quando uma tomografia revelou que 75% dos pulmões estavam comprometidos. “Eu só tava com 25% de pulmão funcionando. Me arrepiei todinho quando soube. Se não tivesse me tratado logo, nem sei. Se eu tirasse o oxigênio, começava a ficar sem ar. Era como se tivesse afogado fora d’água. Tive que manter a calma: se você se aperrear, é pior.”

Vida e morte

Somente no oitavo dia de internação foi que o maqueiro conseguiu levantar da cama e respirar sem auxílio de máscara de oxigênio. Ao fim de dez dias, teve alta. “Me senti um escolhido por Deus, ao ver que tanta gente tava como eu e não conseguiu”. Hoje, cerca de um mês após a alta, o cansaço respiratório ainda o abala, e junto a outra dor – a perda da “filha do coração”, morta pelo novo coronavírus aos 32 anos de idade.

Ariadna
Ariadna, morta aos 32 anos pelo novo coronavírus, considerava Ribeiro como paiFoto: Reprodução/Facebook

Ariadna Mota era ex-enteada de Ribeiro, “criada” por ele dos 4 aos 18 anos de idade, quando o maqueiro foi casado com a mãe da jovem. Mesmo após a separação, ele mantinha contato com a jovem, que o considerava como pai. “Foi horrível e muito rápido. Ela tinha 32 anos, e não tinha nada, nada, nada. Não bebia nem fumava, não tinha doença de pulmão, nada. Foi uma coisa impressionante”.

Ribeiro deduz que a infecção dela pelo novo coronavírus se deu pela quebra do isolamento social. “No começo, ela ficava em casa. Mas ela era evangélica, e como os irmãos não podiam abrir a igreja, faziam reuniões em áreas e quintais. Aglomerações. Ela pegou assim. Começou a tossir, ter febre, e foi aumentando a falta de ar. Foi pro São José, chegou bem, mas foi intubada. Na mesma madrugada, ela já morreu”, relembra.

A “filha do coração” – “uma pessoa alegre, que tinha amizade com todo mundo, não tinha vícios e praticava esportes” – faleceu no sábado (9) anterior ao Dia das Mães, deixando um casal de filhos de 3 e 6 anos de idade. Segundo Ribeiro, a mãe de Ariadna “tava muito esperançosa”, por causa da pouca idade da filha.

Dividido entre a gratidão pela própria vida e o lamento pela perda irreparável, o maqueiro ainda não se sente apto a voltar ao trabalho. “Ainda não tô recuperado. E soube que lá (no IJF) tá uma epidemia só, muita gente doente. E estão dando uma máscara pra pessoa passar um mês. O certo é usar um plantão, e olhe lá”, relata o maqueiro, que assistiu à morte de pelo menos dois colegas de profissão, também levados pela Covid-19.

A Flourish map

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Por Redação do Sobral Pop News com informações do Diário do Nordeste

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